quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

Mais um prego no caixão da redução das relações de trabalho à lei da selva e do Estado Social a um Estado assistencial


Logo no day after das eleições presidenciais, o Governo de Sócrates explicou-nos da forma mais dolorosa e brutal uma das principais razões pelas quais Manuel Alegre, candidato em melhores condições de disputar a 2ª volta por parte das esquerdas, não podia vencer:

Apresentou na Concertação Social a sua proposta para reduzir a indemnização por despedimento, através da imposição de um tecto máximo ao seu valor (12 meses de salário) e da redução para 20 dias de salário por cada ano de trabalho, e aplicando o corte também aos contratos a termo, que seriam assim ainda mais generalizados. Como anzol e isca para anestesiar os actuais trabalhadores, lá prometeu que seria apenas aplicável aos novos contratos de trabalho. Enquanto as confederações patronais gulosas, com a CCP a servir de lebre, já vão pedindo o corpo a quem ofereceu o braço, ou seja, que a redução seja aplicável a todos.

Afinal, não foi este Governo que mandou às malvas o valor dos contratos, da negociação colectiva e dos direitos acordados, ao cortar unilateralmente salários e outros direitos na Função Pública e empresas públicas? E não existem luminárias que, em nome da "igualdade", acham que já agora o melhor é normalizar por baixo e cortar a todos, de modo a ficarmos todos mais pobrezinhos?

O ataque aos direitos e ao Estado Social através do corte geracional!


Este Governo prossegue a táctica, que já vem sendo utilizada pelo poder político e pelos patrões, de recorrer à separação geracional dos trabalhadores no processo de destruição de direitos sociais e laborais duramente conquistados no século XX. Anestesiando e reduzindo a resistência social (afinal, não é para nós, é para os outros…) e aproveitando o conformismo social produzido pela intensa pressão mediática dos "sacrifícios" e da "austeridade" necessárias para sair da crise gerada pelos mesmos que estão a ganhar com ela. Não por acaso, a dimensão do corte de direitos aos novos trabalhadores é menos valorizada nas críticas sindicais.

Enfrentamos assim a desgraçada situação paradoxal de a jovem geração mais preparada e culta de sempre ser também a primeira geração a ter menos direitos, menos trabalho, menos protecção social e salários mais baixos que os seus pais. Enquanto cresce a concentração da riqueza à sombra da captura (não apenas promiscuidade) da política pelos negócios.

A criação de um "fundo" cuja lógica ninguém percebe

Para que serve o fundo para financiar os despedimentos na base de pretensas contribuições das "empresas"que o Governo propõe, de facto cometendo a crueldade social de colocar os trabalhadores a pagarem, através de mais cortes nos salários, o seu próprio funeral? Para estimular a competitividade ou criar empregos, também não é certamente, porque se traduz em mais encargos imediatos nas empresas, como tributação adicional sobre o trabalho, em nome de um suposto "benefício" futuro. Ou este fundo esconde a manobra de vir a ser financiado pela Segurança Social Pública paga pelos trabalhadores, na linha de outros desvios inaceitáveis dos seus dinheiros para os bolsos das empresas?

O argumento que a evidência empírica sempre tem desmentido

A fundamentação governamental e os aplausos patronais e dos seus comentadores de serviço (os tais e os mesmos que nunca se enganam, antes, durante e depois das crises) para estas medidas é a do costume: incentivar a competitividade, promover o crescimento e o emprego.

A mesma treta que PS e PSD nos impingem há anos, com PECs e sem eles: sempre novos assaltos aos direitos e à bolsa (não à Bolsa, que essa protegem-na quanto podem!), com o resultado conhecido de o "bom aluno" ir deslizando cada vez mais para a cauda da Europa – mais desemprego, mais precariedade, contratos a prazo e falsos "recibos verdes", mais pobreza, mais desigualdade, mais atraso económico relativo.

Os ventos e os exemplos de Espanha ou a lógica do plano inclinado?

Um argumento central do Governo é que as indemnizações por despedimento em Portugal são muito elevadas comparativamente com o resto da Europa e que as medidas propostas são iguais às tomadas na vizinha Espanha. Não somos adeptos da ideia de que "de Espanha nem bom vento, nem bom casamento", e nem os padrões de vida, nem as medidas, nem os padrões de rendimento são iguais.

Por isso perguntamos: se é para seguir exemplos, por que carga de água é que não aumentam também o salário mínimo nacional lusitano dos actuais 485 € para os 640 € de Espanha? E, já agora, por que não elevam os salários médios dos trabalhadores portugueses dos actuais 894 € para os 1 538 € da vizinha Espanha ou para as remunerações médias na Europa? E, já agora, porque não harmonizam o IVA, na Espanha de 18% e em Portugal de 23%?

A verdade é que este Governo, como igualmente o PSD, com os seus PECs e o seu servilismo perante uma União Europeia capturada pelos "mercados financeiros" e pela narrativa neoliberal, estão determinados a desvalorizar mais e mais a varíável dos custos do trabalho na vertigem suicidária de que a competitividade económica e o sossego dos "mercados" se resolve através de uma oferta de mão de obra ainda mais barata e indefesa, desmotivada e desprotegida. Assim perpetuando e agravando um modelo económico assente em baixos salários, actividades desvalorizadas e sectores de bens e serviços protegidos e entregues aos grandes interesses privados (os chamados bens não transaccionáveis).


Perguntas à espera de resposta:

Como é que ainda têm a lata de nos contar sempre a mesma história, de que facilitar mais o despedimento é o caminho para mais emprego, num país que já tem uma das mais elevadas taxas europeias de desemprego, de precariedade nos contratos de trabalho, e uma das legislações mais permissivas de despedimento colectivo e dos mais baixos salários?

Qual a racionalidade desta iniciativa do Governo, a não ser a de prosseguir no caminho errático e sem saída de contentar e sossegar os "mercados financeiros" e os seus agentes em Bruxelas, que logo vieram aplaudir esta medida, e de tentar quebrar mais e mais a resistência dos trabalhadores ao desmantelamento do Estado Social e à redução das relações de trabalho à lei da selva?

Mobilização social e iniciativa política à esquerda, precisam-se!

A Concertação Social, em vez de ser um espaço de representação e participação na criação de uma cultura positiva de diálogo social na construção das políticas públicas económico-sociais, continua assim pela mão do Governo PS de Sócrates a ser esvaziada e crescentemente reduzida a um papel instrumental e sem futuro de câmara de ressonância das medidas neoliberais de um Governo "socialista". O conflito e a mobilização social emergem assim como o caminho inevitável para enfrentar os PECs que já cá cantam e os que se preparam.

A retoma da ofensiva anti-social do Governo, após um breve interregno de alguns dias na campanha das presidenciais, põe também a nu a urgente necessidade de reagrupamento das forças sociais e políticas que se opõem a este caminho. A iniciativa do Governo, como também as anunciadas conclusões da Direcção do PS, não aprendendo com a sua responsabilidade na vitória da direita nas presidenciais, pretendendo esquecer Alegre  e "recentrar" o PS, distanciando-o duma esquerda incómoda e virando ao centro (ou à direita, depende do lugar de observação...), não auguram nada de bom.
A rendição da social-democracia na Europa e em Portugal à narrativa neoliberal do capitalismo exige uma agregação e rearrumação de forças por parte de todos quantos não desistem de propor uma alternativa de governação e de política à esquerda, e não se conformam apenas com a resistência social, ou crescerá a captura dos desiludidos pelo abstencionismo e pela demagogia. Então outros saberão, agitando as ilusões populistas da extrema-direita, como se vê na Europa e também sucedeu num passado não muito distante, combinar o ataque à democracia política com a instrumentalização da Questão Social e com a exploração do desalento causado pela sistemática traição das promessas eleitorais pelos partidos de governo.  Os níveis anormalmente elevados de desconfiança interpessoal e no sistema político verificados entre os portugueses são o caldo de cultura e o aviso para isso. A distracção política, as guerras paroquiais e o sectarismo terão um preço elevado.

Henrique Sousa, da Direcção da ATTAC Portugal

Read more...

segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

Coisa nunca vista em noite de eleições: o discurso ressabiado de uma vitória (quase) de Pirro


Ouvimos Cavaco Silva nos seus discursos de vitória no CCB, para a Imprensa e para uma escassa centena e meia de apoiantes, e quase não acreditámos no que ouvimos.

Um discurso ressabiado e vingativo, coisa nunca vista em noite eleitoral, a ajustar contas com todos os outros cinco candidatos, acusados de terem descido como nunca à "vil baixeza" de uma campanha feita de "ataques" e "calúnias" à sua pessoa - ele,  o candidato da "dignidade" que venceu -, e desafiando a comunicação social a revelar os que estariam por detrás da montagem dessa operação de calúnias.

Nem sequer esqueceu a demagogia barata,  já usada na campanha, de se afirmar como o primeiro candidato a vencer umas eleições sem usar cartazes. Mas claro que se "esqueceu" de explicar aos portugueses por que foi  a sua campanha a mais cara, comparativamente com as  dos restantes candidatos.

Ou seja, Cavaco Silva atirou a pedra e mostrou a mão quando os outros candidatos já não se podiam sequer defender, feitos os discursos finais para as televisões e encerrados os seus "tempos de antena". Isto depois de ter passado toda a campanha a recusar esclarecer como devia,  por razões reforçadas sendo candidato a um cargo político unipessoal, os factos indiciadores das suas ligações perigosas.

Que diferença da dignidade manifestada no discurso de Manuel Alegre em que este assumiu a sua derrota política, mas também com clareza o seu compromisso combatente pelo Estado Social!

Fica um mistério para desvendar nos próximos tempos: como é que um candidato assim, com um tamanho azedume no discurso da sua eleição, pode pretender assumir-se como o Presidente de "todos os portugueses" e da "estabilidade", como referiu nas banalidades do costume com que completou o discurso.

Mas a má disposição de Cavaco Silva, a falta de grandeza e dignidade no seu discurso aos portugueses, o azedume vingativo no tratamento dos adversários e a falta de entusiasmo dos apoiantes, têm certamente uma explicação visível nos resultados eleitorais e na circunstância política da sua eleição:

- Cavaco Silva e a direita não alcançaram uma vitória com a dimensão a que aspiravam para os seus projectos de conquista da governação, ganhando com 53% dos votos (50,5% em 2006), mas com menos cerca de 543 000 votos que em 2006.

- Pior do que isso, a abstenção foi a grande venedora da noite (53,4%), batendo o recorde em todas as eleições presidenciais, ultrapassando mesmo os 50% da eleição de Jorge Sampaio em 2001. Ou seja, o número de portugueses que elegeram Cavaco Silva (cerca de 2 243 000) representa apenas 23% dos eleitores, menos de um quarto, e o numero total de votantes nesta eleição (mesmo incluindo os 277 000 votos brancos e nulos, que não são considerados votos expressos) representa apenas 46,6% dos eleitores.

- A campanha eleitoral apeou Cavaco Silva do pedestal em que sempre se colocou, acima dos comuns mortais (a narrativa do "filho do povo" serve-lhe apenas para exaltar o seu mérito da subida aos céus…), ao pôr a nu as ligações perigosas e os proveitos nunca explicados que o relacionam com os seus amigos envolvidos na gestão danosa do BPN. E apenas pode culpar-se a si próprio, pelo modo como fugiu à natural prestação de contas, quanto às consequências que daí advirão para a sua fragilização da sua posição futura como actor político.

Haverá tempo para analisarmos os resultados eleitorais, o falhanço inaceitável dessa maravilha tecnológica que era o cartão do cidadão, o significado da abstenção  política e do voto de protesto no "inverno do nosso descontentamento".

Todavia, e desde já, o facto mais surpreendente da noite eleitoral é esta revelação da fraqueza  e perturbação de um candidato que, vencendo, revela no seu discurso que parte para o seu último mandato,  com legitimidade, mas com desconforto e sem o apoio maioritário desejado. O seu ressabiamento vingativo é a manifestação da consciência da sua fragilidade.

O discurso cauteloso de Passos Coelho, evitando cavalgar a vitória cavaquista, em contraste com a gulodice mediática indisfarçável de Paulo Portas, mostra que o partido maioritário da direita percebeu, como Cavaco, o recado mais profundo da maioria dos portugueses nesta eleição em tempos de crise.


Henrique Sousa, da Direcção da ATTAC Portugal

Read more...

sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

Acordai!


Porque segunda-feira é tarde.

E que as diferenças e divisões à esquerda, o capital acumulado de erros e de queixas, as mágoas com a qualidade da nossa democracia, o descontentamento com as elites políticas que nos têm desgovernado, o quotidiano da crise que nos toca, não nos tirem a lucidez sobre o essencial:

Ou barramos com o voto o caminho ao candidato da direita unificada, que pede respeitinho pelos mercados financeiros e pelo FMI, que quer acelerar a destruição do Estado Social e a sua substituição por um Estado assistencial, que representa o pior situacionismo do bloco central de interesses, que se intitula o mais sério da sua rua mas não esclarece nunca as suas ligações perigosas, ou na segunda-feira acordaremos com o País mais aprisionado neste abraço fatal entre a política e os negócios.

Todos os votos contam para obrigar a passagem à segunda volta, e então juntar forças na derrota de Cavaco Silva. A abstenção descontente, legítima embora como opção, favorece de facto a vitória do candidato da direita á primeira volta.  Então acordaríamos pior na segunda-feira.

E, porque amanhã é sábado, aqui fica a propósito uma bela interpretação de Teresa Salgueiro da canção Acordai, de Fernando Lopes Graça:

Read more...

quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

Para além das sondagens, não abdicar nas Presidenciais de escolhas lúcidas que sustentem os combates de esquerda no futuro

Este já não é o tempo de gastarmos mais tempo com as sondagens. As sondagens, tecnicamente defeituosas ou não, permitem ler tendências, não antecipam resultados. Acresce que a sondagem da Marktest/Diário Económico/TSF hoje divulgada mantém um erro inconcebível num trabalho de especialistas: continua a considerar como votos validamente expressos, nas presidenciais, os nulos e os brancos. Como lucidamente observa Pedro Magalhães no seu blogue Margens de Erro.

A desigualdade de condições políticas e de recursos das candidaturas em presença, é conhecida desde o início desta caminhada. Há muito que sabemos que estas eleições são uma batalha desigual entre um Presidente candidato que luta pela reeleição, levado num andor e procurando colher em seu benefício o mal e a caramunha, e um candidato como Alegre, que procura agrupar as forças de uma esquerda dividida e, sendo do partido do Governo, se tem criticamente distanciado das suas escolhas políticas apadrinhadas por Cavaco Silva. 

Da dificuldade de entendimento das escolhas nestas eleições presidenciais:


 

Nunca como hoje a cumplicidade com o bloco central de interesses na governação prejudicou tanto as esquerdas nas escolhas de voto nas presidenciais. Votar Cavaco é votar no agravamento e aceleração do rumo político que conduziu o País ao desastre, é pôr em perigo o Estado Social, é apadrinhar e proteger a continuidade de um bloco central de interesses que captura a política em favor dos negócios.


 

Mas... Cavaco Silva é apoiado por uma coligação de partidos, PSD-CDS, que está formalmente na oposição ao Governo, embora de facto sustentando as medidas anti-sociais dos PECs e do Orçamento de Estado, aprovadas nos acordos PS-PSD apadrinhados por Cavaco Silva. Manuel Alegre é membro do partido de Sócrates, cuja política é justamente sujeita a forte protesto social, embora tenha também o apoio de um partido da esquerda, o BE, e de outras sensibilidades cidadãs à esquerda que se opõem claramente a este Governo e a esta política. E as esquerdas não superaram as suas divisões nem foram capazes de uma convergência efectiva com o movimento social, sendo as candidaturas apresentadas a opção possível, mas certamente exprimindo também os impasses políticos existentes, em confronto com uma direita unida e espreitando a realização do seu sonho de controlo absoluto do poder político.


 

Confusos?

Mas isto faz parte do contexto das escolhas políticas destas eleições. E esta luta eleitoral, sendo desigual, não pode ser abandonada pelas esquerdas, partidariamente organizadas ou não, pelo valor intrínseco das Presidenciais e pela projecção deste combate eleitoral e dos seus resultados nos combates futuros por uma democracia social e política que não seja secundarizada e subordinada aos mercados financeiros e duma política que não esteja capturada pelos negócios.

Até ao dia 23, cumpre-nos contribuir para que as escolhas dos cidadãos sejam tão informadas quanto for possível, num quadro eleitoral muito perturbado e condicionado pela conjuntura política. E quanto melhor for o resultado de Manuel Alegre (e de outros candidatos à esquerda, como Francisco Lopes), em melhores condições estará a esquerda para travar os combates seguintes. Para que a crise económica não seja o alibi dos poderosos para nos empurrarem mais e mais para uma crise social e política sem precedentes.

Depois, teremos tempo para a avaliação lúcida destas eleições, dos seus resultados e das suas causas. Esperando que à esquerda haja então capacidade de resistir às tendências e cenários especulados no artigo do Público de hoje, que pretende antecipar um day after marcado pela procura de bodes expiatórios e que haja capacidade de trabalhar pela construção do diálogo e da convergência de quantos acreditam que o caminho não é mais jogar o jogo dos "mercados" e do monetarismo neoliberal de uma União Europeia capturada pelos mais poderosos, mas avançar na construção de uma alternativa política. Com as rupturas que sejam necessárias. Para que a resistência e o protesto social que vão crescer tenham tradução política e não nos confrontemos com uma democracia politicamente esvaziada e bloqueada, parteira de soluções messiânicas e populistas perigosas (ver aqui o nosso texto sobre a emergência de uma extrema-direita "modernizada").

Henrique Sousa, da Direcção da ATTAC Portugal


 

Read more...

segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

Afinal, Cavaco Silva queria mais!

A imprensa noticiou diligentemente declarações de Cavaco Silva nos Arcos de Valdevez em que este, com o seu jogo de banalidades, equívocos e ambiguidades habituais, teria criticado os cortes salariais na função pública ao mencionar piedosamente no seu discurso os «funcionários públicos duramente atingidos nesta crise».

Afinal, logo no dia seguinte, em Penafiel, continuando embora com o seu estilo discursivo de oráculo, cujas distintas interpretações acertam sempre no resultado, viu-se obrigado a dar um passo em frente na explicação. Vejamos as suas declarações, noticiadas pelo DN (ver aqui) e por outros jornais:

"Largos milhares de portugueses" do sector privado ficaram fora dessa tributação, lembrou o candidato a Belém em Penafiel. "Não se sabe que as reduções de rendimentos só foram aplicadas a funcionários públicos? Não percebo...", disse Cavaco perante as perguntas dos jornalistas. Interpelado sobre a possibilidade de cortes salariais para escalões mais elevados de rendimentos, através do IRS, respondeu: "Não há formas diferentes de fazer a questão, que não seja pela via dos cortes salariais".

Ou seja: este candidato que é também Presidente da República há cinco anos, que se fartou de chamar a si os louros dos acordos PS/PSD para a aprovação dos PECs governativos e do Orçamento de Estado de má mémória, resolveu (eleições obrigam!) dar uma no cravo e três na ferradura:

Uma lágrima de crocodilo do padrinho dos PECs para os funcionários públicos duramente flagelados, logo seguida da insinuação (porque clareza não, várias portas de saída ajudam sempre...) de que combater as injustiças e desigualdades seria, pasme-se, não anular os cortes salariais na funçãó pública, mas estender os cortes aos trabalhadores do sector privado, logo esclarecendo que tributar mais os altos rendimentos em sede de IRS, isso não.

Afinal, não é isto que as confederações patronais também querem, o direito de reduzirem os salários em todo o lado, rasgando acordos e contratos, em nome da sacrossanta competitividade terceiro-mundista a que aspiram?

Henrique Sousa, da Direcção da ATTAC Portugal

Read more...

O paradoxo das escolhas políticas nas Presidenciais



Quem escolhe Cavaco Silva vota no candidato de uma coligação de partidos (PSD e CDS-PP), que se prepara para lhes entregar a governação, que está de acordo com os PECs e as orientações e medidas do Governo de Sócrates e da UE, que acha que é preciso mostrar respeitinho pelos mercados na orientação política e não ofender os seus bons sentimentos. Ou seja, a eleição de Cavaco Silva significa mais do mesmo e a experiência e saber de que se ufana serão presente envenenado para os portugueses. Os remédios serão ainda piores. Votar nele é patrocinar o bloco central de interesses, que sempre assumiu, em versão agravada. Já prometeu salvar a Nação há 5 anos com o seu proclamado saber de experiência e economia feito. Viu-se. É pelo assistencialismo social como substituto do Estado Social. Para ele, o País está errado, os mercados financeiros não. Os trabalhadores e o trabalho causam-lhe urticária, a não ser se modestos, respeitadores, veneradores e obrigados. Talvez por isso use pouco tais palavras. Sente-se mais confortável na ostentação da caridade social, na companhia dos poderosos (ver Comissão de Honra) e em ligações perigosas que continuam por explicar.

Quem escolhe Manuel Alegre, sabe que o candidato é apoiado pelo partido do Governo e pelo Primeiro-Ministro que tem a pouco honrosa folha de serviços conhecida e também pelo BE, que assume uma oposição frontal a este Governo. Mas sabe também que é um candidato de uma coligação de cidadãos apoiada por partidos, que não abençoou os PECs, que não considera a actual orientação política do País e da UE capaz de enfrentar a crise, que tem recusado abençoar a política do PS, marca distância crítica em relação ao Governo e se assume como um socialista independente nas ideias e na sua prática política. É pelo Estado Social e pela sua universalidade. Esteve frontalmente contra a revisão anti-laboral do Código do Trabalho. Assume, na contradição dos apoios partidários recebidos, a coerência de defender o diálogo e a convergência das esquerdas.

Os outros candidatos, cumprem os respectivos papéis. Coelho é, nas suas próprias palavras, um outsider populista que tem o mérito de exprimir desassombradamente, nas contradições do que defende e propõe, a revolta contra os poderosos. Defensor Moura já justificou a candidatura pelo modo frontal como num debate televisivo apeou Cavaco Silva do pedestal de que não queria sair e pôs à mostra os seus pés de barro. Francisco Lopes cumpre profissionalmente a sua missão partidária de mobilizar o eleitorado do PCP e de aproveitar a campanha presidencial para divulgar os pontos de vista do partido; em rigor, é um partido "candidato" a um órgão unipessoal para ocupar espaço de debate. Fernando Nobre vai evidenciando na campanha a diferença entre ser um destacado activista social e ser candidato a um cargo político, ou, dito de outro modo, ilustra bem nestas eleições a aplicação do princípio de Peter, tendo dado um passo maior que a sua perna e revelando a enorme fragilidade do seu pensamento e posicionamento políticos.


Em conclusão:
 
Estas eleições presidenciais contrariam a lógica formal dos alinhamentos partidários e exigem escolhas cidadãs voltadas para a substância política das coisas.

Ou seja, quem vote Cavaco vota, mesmo com as melhores intenções (e delas está o inferno cheio), no agravamento do situacionismo de interesses financeiros e económicos instalados e das desigualdades que estão na origem da crise actual.

Quem vote em Alegre, filiado no partido do Governo, vota num cidadão que se opõe às escolhas que têm comandado a política portuguesa, que assume um claro compromisso de fidelidade à Constituição actual, à defesa do Estado Social e se opõe às orientações neoliberais e ao comando da política pelos mercados financeiros.

O voto em Manuel Alegre interessa, além do eleitorado socialista, a todos quantos não concordam com o rumo político do País dos últimos anos, comandado por PS e PSD, e desejam construir uma alternativa.
O voto em Cavaco Silva é um voto na continuidade e agravamento da orientação política do bloco central de interesses que conduziu o País à desastrosa situação actual e a promessa de aceleração de uma crise política anunciada e desejada pelo PSD e pelo CDS-PP.

Eis o paradoxo das eleições presidenciais e das escolhas políticas em jogo. Oxalá que os últimos dias desta campanha eleitoral diminuída pelo impacto da crise e empobrecida no debate político tornem mais claras, por debaixo das aparências e dos alinhamentos partidários formais, as escolhas reais que se perfilam e as suas consequências para o nosso futuro colectivo.

Henrique Sousa, da Direcção da ATTAC Portugal

Read more...

domingo, 16 de janeiro de 2011

Um espectro assombra a Europa

Não, desta vez não é o espectro do comunismo, de que falava o Manifesto Comunista de Marx e Engels no século XIX, que assombra a Europa, fornecendo esperança ao movimento social e operário.

É o espectro de uma extrema-direita, recauchutada e “modernizada”, que em vários países europeus procura cavalgar a crise e o naufrágio do projecto europeu, o desemprego, o ataque aos direitos sociais, numa eficaz mistura da exploração dos problemas sociais com o seu tradicional discurso nacionalista, securitário e contra a imigração, e “actualizando” o seu discurso xenófobo com a utilização instrumental do secularismo como arma de combate contra os muçulmanos. Penetrando crescentemente em sectores sociais mais fustigados pela crise económica e social, procura abandonar a velha imagem marginal anti-sistema associada à pública simpatia pelo nazismo e pelo fascismo, lavar a fachada, superar a retórica no domínio dos costumes e assumir uma face “respeitável” para lutar pela conquista da hegemonia dentro do sistema político e social. Possuindo também um denominador mais ou menos comum – o apoio a Israel, em nome do combate à “islamização do Ocidente” -, como se demonstrou na calorosa visita em Dezembro (ver aqui) de uma delegação da extrema-direita europeia a Israel, em nome do combate à “islamização do Ocidente”.

Na Suíça, o partido mais votado é um partido da extrema-direita, a UDC, com 29% dos votos e que conduziu o vergonhoso referendo contra a construção de minaretes. Na Holanda, o Partido da Liberdade de Geert Wilders tornou-se o terceiro partido mais votado, com 15,5% dos votos, com uma campanha “contra a islamização da Holanda”. Na Itália, a Liga Norte de Bossi, fazendo campanha pelo Norte rico contra o Sul pobre e contra a imigração, tem 4 ministros no Governo Berlusconi, 60 deputados e mais 6 deputados no conjunto da extrema direita do PE, num total de 36. Na Hungria (o país onde o próprio Governo de direita, que preside actualmente à União Europeia, está a enterrar a liberdade de imprensa), o Jobbik, partido anti-ciganos com uma milícia paramilitar, já é o terceiro partido político em termos eleitorais. Na Bélgica, o partido independentista Vlaams Belang da extrema-direita flamenga conquistou 12 deputados nas últimas eleições. Na Áustria, o Partido da Liberdade conquistou 27% dos votos nas últimas eleições locais em Viena, além da forte votação nas legislativas e europeias. Também nos países nórdicos, na Suécia e na Dinamarca, os partidos da extrema-direita têm vindo a crescer eleitoralmente na base da retórica anti-imigração.

No conjunto, como é referido no interessante dossier sobre a extrema-direita publicado na edição de Janeiro do Le Monde Diplomatique, os partidos da extrema-direita conquistaram nas últimas eleições europeias e outras eleições nacionais posteriores mais de 10% dos votos em 11 países.

A eleição de Marine Le Pen para presidente da Frente Nacional francesa é o mais recente episódio deste processo, culminando uma bem conseguida campanha mediática para suceder ao seu pai e apresentar-se como o rosto respeitável, “social” e “modernizador” da extrema-direita, sem dispensar também o recurso a declarações públicas condenando as orações muçulmanas no espaço público como comparáveis com a ocupação nazi. Investindo fortemente na conquista do eleitorado da direita e dos sectores sociais mais atingidos pela crise, as suas posições (ver aqui) têm a condenação de 61%, mas recolhem a aprovação de 39% dos franceses (49% entre os operários, 42% entre os jovens dos 25 aos 34 anos), recolhe 18% num índice de popularidade entre os franceses (sondagem de Janeiro de TNS Sofres/Figaro) e 14% numa sondagem sobre as intenções de voto nas presidenciais de 2012 (ver aqui), sendo a terceira figura mais votada depois de Sarkozy e da dirigente socialista Martine Aubry.

Lembram-se?

Quando a URSS e os regimes governados por partidos comunistas no Leste da Europa implodiram, a social-democracia esfregou as mãos de contente, pensou que escapava e foi a correr meter-se na boca do lobo do neoliberalismo através da terceira via de Blair, Schroeder & Cª, não reconhecendo nem compreendendo o enorme desafio que a profundidade dessas mudanças políticas colocava a toda a esquerda e não apenas aos comunistas.

O resultado, viu-se e vê-se numa União Europeia a naufragar e em risco de afogamento, em que os responsáveis da crise pregam receitas destinadas a agravar as desigualdades e tornar a política ainda mais refém dos mercados financeiros e dos poderosos, com a cumplicidade dos governos, incluindo os que se afirmam socialistas e sociais-democratas, que têm vindo a “comprar” as teses xenófobas e racistas da extrema-direita. A qual, assim, vai ganhando espaço no combate pela hegemonia das ideias e valores e preparando o terreno para mais altos voos.

Este “filme” não é novo.

Não apaguemos da memória colectiva o que se passou nos anos 20 e 30 na Europa, após a primeira grande guerra, em plena crise económica e financeira internacional, em que a ascensão dos fascismos, misturando também a exaltação nacionalista, o discurso xenófobo e anti-judeu (agora, o sucedâneo é anti-muçulmano), uma retórica anticapitalista, a promessa de direitos sociais aos explorados, levou à ocupação de quase toda a Europa por ditaduras e lançou a semente da guerra mais mortífera que a Humanidade conheceu.

E agora?

São notórias as dificuldades das esquerdas europeias de apresentarem alternativas políticas credíveis, socialmente mobilizadoras e agregadoras de forças. Essas dificuldades são notórias também em Portugal, e no quadro político actual das presidenciais. Mas este é um desafio incontornável da época que vivemos. Ou aumentarão os riscos de tanto os que temem a perda de privilégios, como os flagelados por uma crise que lhes caiu em cima, serem todos capturados pela mistura perigosa e populista de demagogia social, securitarismo, xenofobia e nacionalismo da extrema-direita, directamente ou pela inoculação dos seus valores e narrativas nos comportamentos sociais e políticos.

Se neste canto extremo e periférico da Europa chegam mais tardiamente os movimentos políticos e culturais, convém não nos iludirmos com a treta do “Portugal de brandos costumes” ou acreditar que escapamos a estes desafios. No day after das eleições presidenciais, aos cidadãos de esquerda, com e sem partido, ou que pelo menos não acreditam nem na teologia neoliberal dos mercados nem em receitas xenófobas que transformam o “outro” em inimigo, continuará de modo mais premente e exigente a necessidade de encetar a caminhada de agregar forças para uma alternativa política a sério. Que dê uma resposta exigente e não superficial à Questão Social renascida. Que rompa com o desgraçado bloco central de interesses que tem conduzido o País para a pantanosa e desgraçada situação actual, sem cair nos engodos mais radicalizados da direita.

Henrique Sousa, da Direcção da ATTAC Portugal

Read more...

terça-feira, 11 de janeiro de 2011

Código Contributivo e Segurança Social :: Sessão de Esclarecimento ::


15 de Janeiro, 15h
LX Factory, Edifício Principal, 4º Andar 
Quarto com Vista, Alcântara, Lisboa

No dia 1 de Janeiro de 2011 entrou em vigor o novo Código Contributivo e os 900 mil falsos recibos verdes ficaram mais uma sem informações da Seg. Social sobre as mudanças que estavam a ocorrer. O número de informação da Seg. Social foi abaixo e muita gente acorreu aos balcões.
A contribuição vai diminuir ou aumentar? Como devo fazer para pagar? O que mudou? Para que serve a Segurança Social? - estas são as perguntas que centenas de pessoas têm feito aos Precári@s Inflexíveis.
Por isso, convidámos uma dirigente da CGTP e uma advogada para virem tirar todas as dúvidas e para podermos discutir o que é, para que serve e o que queremos da Segurança Social.
A sessão é aberta e gratuita para todos.

Organização dos Precários Inflexíveis.

Read more...

WikiLeaks: a perseguição do império e o ataque à privacidade nas redes sociais

O Departamento de Justiça norte-americano intimou os responsáveis do Twitter a fornecerem dados sobre a correspondência privada, contactos e outros dados pessoais de vários cidadãos suspeitos de colaboração com o WikiLeaks, incluindo o soldado Bradley Manning (preso e incomunicável há meses) e uma deputada do Parlamento da Islândia (!). Prossegue assim a declarada cruzada da Administração Obama para perseguir e julgar Assange, principal responsável do WikiLeaks, cidadão australiano e que não reside nos EUA, agora não hesitando em invadir a privacidade doutros cidadãos, incluindo estrangeiros e mesmo uma deputada de um outro país soberano (ver aqui a informação completa).

Este é o mesmo país cujos governantes ainda se afirmam guardiães da liberdade e polícias do mundo.Que criticaram as pressões da China sobre o Google, que invadiram o Iraque e o Afeganistão em nome da imposição aos outros da "sua" liberdade e democracia, que recusam aceitar a submissão dos seus cidadãos ao Tribunal Penal Internacional (achando muito bem que os outros se submetam), certamente porque já vai extensa a lista dos seus crimes de guerra e contra a humanidade em vários teatros de operações.

Como já alertou a organização WikiLeaks, a pressão judicial dos EUA sobre o Twitter provavelmente também se exerceu sobre o Google e o Facebook, que não desmentiram tais pressões. Recordemos que a WikiLeaks tem milhão e meio de seguidores no Facebook e 600 000 no Twitter. Ou seja, à boleia da divulgação pública dos documentos do Departamento de Estado, os EUA preparam uma gigantesca operação repressiva e invasora da liberdade dos cidadãos na Internet e nas redes sociais, contando certamente com a cooperação de países "amigos" e mandando às urtigas as proclamações de amor à democracia.

É tempo de a comunidade de cidadãos que defendem a liberdade na Internet e se opõem ao seu apetecido controlo pelos Estados, pelas transnacionais e pelos poderes fácticos, reforçarem a vigilância e a mobilização global para impedir o assalto à privacidade em curso. Agora a WikiLeaks e quantos a apoiam, depois quem mais e o quê?

Pagaremos caro a indiferença, a passividade ou o conformismo...

E vem-nos à memória um conhecido poema atribuído a Brecht, de que aqui fica uma versão conhecida:
A indiferença

Primeiro levaram os comunistas,
Mas eu não me importei
Porque não era nada comigo.
Em seguida levaram alguns operários,
Mas a mim não me afectou
Porque eu não sou operário.
Depois prenderam os sindicalistas,
Mas eu não me incomodei
Porque nunca fui sindicalista.
Logo a seguir chegou a vez
De alguns padres, mas como
Nunca fui religioso, também não liguei

Henrique Sousa, Direcção da ATTAC Portugal

Read more...

domingo, 9 de janeiro de 2011

Nas Presidenciais, um alerta útil da CNE para quem não abdica de exercer o seu direito de voto

Nas eleições presidenciais em Portugal, os votos brancos e os votos nulos não contam como votos validamente expressos. Só contam como tais os votos nos candidatos concorrentes. Ou seja, brancos e nulos são equivalentes tecnicamente a abstenção.
A Comissão Nacional de Eleições acaba de produzir a este respeito um esclarecimento que importa ser tido em conta por todos quantos não abdicam de tomar posição e exercer o seu direito de voto nestas eleições(ver aqui).

Henrique Sousa, da Direcção ATTAC Portugal

Read more...

About This Blog

  © Blogger templates The Professional Template by Ourblogtemplates.com 2008

Back to TOP