quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

Para além das sondagens, não abdicar nas Presidenciais de escolhas lúcidas que sustentem os combates de esquerda no futuro

Este já não é o tempo de gastarmos mais tempo com as sondagens. As sondagens, tecnicamente defeituosas ou não, permitem ler tendências, não antecipam resultados. Acresce que a sondagem da Marktest/Diário Económico/TSF hoje divulgada mantém um erro inconcebível num trabalho de especialistas: continua a considerar como votos validamente expressos, nas presidenciais, os nulos e os brancos. Como lucidamente observa Pedro Magalhães no seu blogue Margens de Erro.

A desigualdade de condições políticas e de recursos das candidaturas em presença, é conhecida desde o início desta caminhada. Há muito que sabemos que estas eleições são uma batalha desigual entre um Presidente candidato que luta pela reeleição, levado num andor e procurando colher em seu benefício o mal e a caramunha, e um candidato como Alegre, que procura agrupar as forças de uma esquerda dividida e, sendo do partido do Governo, se tem criticamente distanciado das suas escolhas políticas apadrinhadas por Cavaco Silva. 

Da dificuldade de entendimento das escolhas nestas eleições presidenciais:


 

Nunca como hoje a cumplicidade com o bloco central de interesses na governação prejudicou tanto as esquerdas nas escolhas de voto nas presidenciais. Votar Cavaco é votar no agravamento e aceleração do rumo político que conduziu o País ao desastre, é pôr em perigo o Estado Social, é apadrinhar e proteger a continuidade de um bloco central de interesses que captura a política em favor dos negócios.


 

Mas... Cavaco Silva é apoiado por uma coligação de partidos, PSD-CDS, que está formalmente na oposição ao Governo, embora de facto sustentando as medidas anti-sociais dos PECs e do Orçamento de Estado, aprovadas nos acordos PS-PSD apadrinhados por Cavaco Silva. Manuel Alegre é membro do partido de Sócrates, cuja política é justamente sujeita a forte protesto social, embora tenha também o apoio de um partido da esquerda, o BE, e de outras sensibilidades cidadãs à esquerda que se opõem claramente a este Governo e a esta política. E as esquerdas não superaram as suas divisões nem foram capazes de uma convergência efectiva com o movimento social, sendo as candidaturas apresentadas a opção possível, mas certamente exprimindo também os impasses políticos existentes, em confronto com uma direita unida e espreitando a realização do seu sonho de controlo absoluto do poder político.


 

Confusos?

Mas isto faz parte do contexto das escolhas políticas destas eleições. E esta luta eleitoral, sendo desigual, não pode ser abandonada pelas esquerdas, partidariamente organizadas ou não, pelo valor intrínseco das Presidenciais e pela projecção deste combate eleitoral e dos seus resultados nos combates futuros por uma democracia social e política que não seja secundarizada e subordinada aos mercados financeiros e duma política que não esteja capturada pelos negócios.

Até ao dia 23, cumpre-nos contribuir para que as escolhas dos cidadãos sejam tão informadas quanto for possível, num quadro eleitoral muito perturbado e condicionado pela conjuntura política. E quanto melhor for o resultado de Manuel Alegre (e de outros candidatos à esquerda, como Francisco Lopes), em melhores condições estará a esquerda para travar os combates seguintes. Para que a crise económica não seja o alibi dos poderosos para nos empurrarem mais e mais para uma crise social e política sem precedentes.

Depois, teremos tempo para a avaliação lúcida destas eleições, dos seus resultados e das suas causas. Esperando que à esquerda haja então capacidade de resistir às tendências e cenários especulados no artigo do Público de hoje, que pretende antecipar um day after marcado pela procura de bodes expiatórios e que haja capacidade de trabalhar pela construção do diálogo e da convergência de quantos acreditam que o caminho não é mais jogar o jogo dos "mercados" e do monetarismo neoliberal de uma União Europeia capturada pelos mais poderosos, mas avançar na construção de uma alternativa política. Com as rupturas que sejam necessárias. Para que a resistência e o protesto social que vão crescer tenham tradução política e não nos confrontemos com uma democracia politicamente esvaziada e bloqueada, parteira de soluções messiânicas e populistas perigosas (ver aqui o nosso texto sobre a emergência de uma extrema-direita "modernizada").

Henrique Sousa, da Direcção da ATTAC Portugal


 

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